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Multo, prendo e arrebento


Data: 15 de março de 2010
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As frequentes viagens feitas pelo presidente Lula à Venezuela chavista devem ter inspirado as mudanças. São comuns por lá lojas fechadas, com faixas indicando que o estabelecimento foi lacrado pelo Fisco, por irregularidades tributárias. O problema é que, num Estado policial, os inimigos podem ser escolhidos a dedo.


E o Brasil pode caminhar na mesma direção, se forem aprovadas as mudanças propostas pelo Executivo no Código Tributário e no processo de execução de débitos inscritos na dívida ativa. Quatro projetos em discussão na Câmara dos Deputados pretendem tirar do Judiciário e colocar nas mãos da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, ligada ao Ministério da Fazenda e à Advocacia-Geral da União, o poder de penhorar bens para garantir o pagamento de dívidas tributárias.

Com a mudança, será possível a penhora administrativa a partir do início do processo, tornando o bem indisponível sem que a decisão passe pelo Judiciário. “É uma lei autoritária”, protesta o presidente nacional da OAB, Ophir Cavalcante.  “Quebra a lógica da Constituição de privilegiar o cidadão para privilegiar o Estado”, afirmou ele à DINHEIRO. O ex-secretário da Receita Federal Everardo Maciel diz que a mudança cria um desequilíbrio grande em favor do Fisco, com a penhora antes mesmo do julgamento e a obrigatoriedade de que o contribuinte pague os tributos antes de qualquer outra coisa, incluindo salários e fornecedores. “Por que não se faz a mesma coisa quando se trata de precatórios, que são uma obrigação do governo em favor do contribuinte?”, questiona.

Muitos especialistas no setor tributário avaliam que transferir tantos poderes ao Executivo fragiliza a defesa dos contribuintes. “É inconstitucional. Cabe ao Judiciário fazer constrição de liberdade e de patrimônio”, afirmou o advogado tributarista Eduardo Pugliese, sócio do escritório Souza, Schneider, Pugliese e Sztokfisz. “Fere o direito de propriedade, o direito ao contraditório e o direto a defesa”, afirmou.

O plano do governo permite a penhora antes do julgamento e responsabiliza até diretores de empresas por eventuais débitos tributários. Por outro lado, o projeto institui um mecanismo de negociação para contribuintes inadimplentes. Uma espécie de Refis permanente. O problema, neste caso, é o risco de estimular a inadimplência, já que a empresa pode preferir atrasar os pagamentos para depois negociar e pagar em condições mais vantajosas. A Advocacia-Geral da União, que coordena o trabalho, defendeu as mudanças.

“A ideia é incorporar na dinâmica do contencioso tributário os elementos de flexibilização necessários a não perpetuação indefinida de ações ou de disputas tributárias, como tem ocorrido muito no Brasil”, afirmou o ministro-chefe da AGU, Luiz Adams, em encontro na semana passada na OAB, onde pediu o apoio da entidade. Everardo Maciel não acredita que a negociação vingue.

“Na prática os fiscais não terão coragem de fazer isso, porque poderão ser acusados de oferecer condições mais vantajosas para uma ou outra empresa”, afirma. Outra consequência previsível de uma ação desse tipo é que empresários tentem proteger seu patrimônio de ações arbitrárias, enviando recursos para fora do País.

Fonte: Revista Isto É Dinheiro / Denize Bacoccina

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